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as ficções de borges e os labirintos dos livros e do cotidiano, com júlio pimentel pinto (íntegra)

O mundo foi feito para acabar em livros

 A paixão pelas bibliotecas, leituras e releituras marcou o debate no Café Filosófico CPFL sobre “As ficções de Borges e os labirintos dos livros e do cotidiano”, com o historiador e professor da USP Julio Pimentel Pinto.

O escritor é o amanuense do engenho alheio, dizia Jorge Luis Borges. Para ele, o bom autor é aquele capaz de reunir textos alheios e fazer outra versão. O ofício da leitura, portanto, precede o da escritura: são os sucessores dos clássicos quem elegem os antecessores e determinam a força de sua obra.

No Café Filosófico CPFL de sexta-feira, 13/03 (confira abaixo), a paixão pelas bibliotecas, leituras e releituras pontuou o debate sobre “As ficções de Borges e os labirintos dos livros e do cotidiano”, com o historiador e professor da USP Julio Pimentel Pinto.

“Borges é menos lido do que citado. É um autor que parece mais difícil do que é. O universo borgeano já sugere uma dimensão onírica e fantástica. Ele parece um personagem fora do mundo, e por isso a imagem que prevalece é a de um escritor clássico e distante da vida cotidiana. Mas não é assim”, disse.

Para entender o autor, afirmou Julio Pimentel, é preciso entender suas referências. “Borges gostava de citar Mallarmé, segundo quem o mundo foi feito para acabar em livro. Ele leu Dom Quixote, primeiro, em inglês. Depois, em espanhol – e achou a edição uma tradução malfeita do inglês”, lembrou.

A obsessão do escritor pelas releituras influenciava sua escrita. “A cada reedição de seus livros, ele mudava, incluía, suprimia os textos. A obsessão da reescritura, em Borges, era tanta que ele corrigia a mão os seus próprios livros nas bibliotecas.”

De acordo com o palestrante, essa figura singular do gênio argentino deu origem a incompreensões sobre sua vida e obra. Um erro comum é a associação dele como um homem “alienado, um clássico distante do mundo”. “A defesa do cosmopolitismo, em Borges, é uma forma de reagir à política nacionalista do peronismo”, sugeriu. “Esse autor vivia imerso no cotidiano. Ele vivia imerso em labirintos, mas em labirintos reais, e não só imaginários. Perder-se num labirinto é o que melhor pode acontecer ao ser-humano.”

Para Julio Pimentel, as posições políticas de Borges o afastaram de gerações de leitores. “Numa América Latina cortada por ditaduras, não se podia dar o Nobel a quem dava opiniões simpáticas a Pinochet.”

Hoje, com o seu lugar assegurado entre os cânones, Borges serve como referência às novas gerações ainda refratárias à ideia de enveredar por um mundo que acaba em livros.

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