cafe filosófico

“a vida em rede” (editora papirus 7 mares), com ronaldo lemos e massimo di felice (íntegra)

Muito além das redes sociais

No debate de lançamento do livro “A Vida em Rede”, Ronaldo Lemos e Massimo di Felice falam como a tecnologia revolucionou a comunicação não apenas entre cidadãos, mas entre os cidadãos e o mundo onde vivem

“O Facebook sabe mais da gente do que a gente mesmo. A gente tem uma ideia do que a gente é. O Facebook tem os dados”. A análise foi feita pelo advogado e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro Ronaldo Lemos durante o Café Filosófico Especial de lançamento do livro “A Vida em Rede”.

Ao lado do sociólogo e professor da USP Massimo di Felice, coautor da obra, Lemos mostrou como a tecnologia, uma espécie de infraestrutura da nossa vida e dos sistemas sociais, revolucionou as formas de relacionamento. Essa nova dinâmica, disseram os autores, alterou as relações não apenas entre cidadãos, mas entre cidadãos, o Estado e a biodiversisdade. “O avanço tecnológico hoje é um desafio para um gigante chamado Estado, inclusive para a tributação”, disse Lemos. “Hoje produzimos valor econômico para redes sociais quando ficamos na internet após o trabalho. Geramos valor.”

Segundo ele, a internet muda o debate público ao ampliar nossa exposição ao pensamento do outro. “Com ela, a mensagem pode ser transformada, ressignificada, debatida. Essa dinâmica complicou a vida do marqueteiro”. E completou: “O totalitarismo é fundado no modelo do debate único. A rede, nesse sentido, reforça a democracia”.

Di Felice, em sua fala, afirmou que é preciso entender as oportunidades para o conhecimento surgidas a partir da tecnologia. “A internet, livre para circular ideias, é produto do mercado. O modelo controlador chinês não tem futuro.” Segundo ele, o modelo democracia representativa do ocidente reduziu a participação dos cidadãos na esfera pública, mas a tecnologia contemporânea superou essa mediação.

“Começamos a pensar em uma hiper-inteligência que une as diferentes inteligências do mundo. O Parlamento une a inteligência entre humanos, mas não a inteligência do Planeta e a nossa relação, por exemplo, com o meio ambiente.”

Para Felice, a ideia de rede transformou a ideia de comunicação, “uma ideia industrial eficaz, sistêmica, receptiva”. “A comunicação em rede não é de A para B, mas uma experiência em que todos falam.”

A digitalização das informações, nesse sentido, não é transferência de informação de um ponto para outro, mas uma transfiguração. “A transfiguração consegue fazer a comunicação de tudo o que existe. Essa ideia tem a ver com a nossa relação com a biodiversidade. A conectividade vai além das redes sociais. A nova ideia de comunidade é mais complexa. Está relacionada a toda a bioesfera. É o conceito que vamos deixar aos filhos.”

Para Felice, a comunicação digital e as redes digitais não são limitadas a uma disciplina, como a engenharia e a comunicação. “É uma transformação total.” A técnica, disse ele, não é apenas os instrumentos do conhecimento, mas a própria arquitetura de conhecimento. Exemplo disso são hoje os e-books. “No contexto digital, tudo o que conhecemos é adquirido por meio de fluxos de comunicação digitais. A rede nos provoca a ir além da dicotomia tecnologia x humanos.”

café filosófico especial | lançamento do livro “a vida em rede” (editora papirus 7 mares), de ronaldo lemos (professor da faculdade de direito da uerj) e massimo di felice (sociólogo e professor das usp), com bate-papo entre os autores.

estamos em constante movimento. pequenas mudanças, horizontais, povoam nosso cotidiano.

mas, às vezes, ocorrem transformações verticais em nossa vida. é o caso da revolução impulsionada pelos avanços tecnológicos das últimas décadas. a democracia nunca mais será como antes, nem a comunicação, nem a educação, nem quase nada do jeito de viver de indivíduos e sociedade.

a vida em rede rompe com a lógica emissor-receptor, altera as noções de hierarquia, privacidade, cidadania, consumo – enfim, ainda estamos aprendendo e desenvolvendo um novo modus faciendi. desafios estimulantes surgem a cada momento. o que nos espera? e o que esperamos? nada. somos, mais do que nunca, agentes do presente e do futuro.

conecte-se neste debate, manifeste sua opinião.

ronaldo lemos – é diretor do instituto de tecnologia e sociedade do rio de janeiro (itsrio.org) e professor da faculdade de direito da universidade estadual do rio de janeiro. pesquisador visitante e representante do mit media lab para o brasil, graduou-se em direito pela universidade de são paulo, é mestre pela universidade de harvard e doutor pela universidade de são paulo nessa mesma área. foi professor visitante da universidade de princeton, afiliado ao center for information technology policy. é ainda diretor do projeto creative commons no brasil, tendo recebido o golden nica na categoria digital communities, do prix ars electronica 2007, pela criação do site overmundo. além de membro do conselho de administração da mozilla, é sócio do escritório pereira neto macedo advogados. publicou vários livros e estudos no brasil e no exterior e escreve semanalmente para a folha de s. paulo, dentre outras publicações. é um dos curadores da enciclopédia itaú cultural de arte e cultura brasileiras.

massimo di felice – graduou-se em sociologia pela università degli studi la sapienza, é doutor em ciências da comunicação pela universidade de são paulo e realizou seu pós-doutorado em sociologia pela universidade paris descartes v, sorbonne. é professor da universidade de são paulo, ministrando aulas na graduação e pós-graduação da escola de comunicações e artes (eca-usp). é professor visitante na libera università di lingue e comunicazione de milão e professor convidado na universidade nacional de córdoba, argentina. tem experiência nas áreas de sociologia, antropologia e comunicação, com ênfase em comunicação digital, principalmente nos temas: aspectos teóricos da comunicação digital, formas comunicativas do habitar, net-ativismo, sociabilidades em rede e espaços públicos digitais. é fundador do centro de pesquisa atopos (eca-usp) e autor de vários ensaios e artigos publicados em revistas europeias. no brasil, coordena a coleção atopos (ed. annablume) e a coleção era digital (ed. difusão).

gravado em 16 de setembro de 2014.