A abertura
Por Daniela Ortolani Pagotto
A noite cai, a lua se revela cheia.
Dentro da tenda dos autores os cochichos seguem…uns se ajeitam, outros ainda procurando seu espaço…
“tem lugar aí?” “gostou da mesa anterior?” “onde nós vamos após a mesa”…
É dada a abertura…
“do que é esta mesa mesmo?” “chio, silêncio, presta atenção!” “mas quem vai falar?, me dá o livreto da programação”, “tá na pousada….agora silêncio, tá começando”….
A abertura é dada com “Drummond em voz alta”.Uma escritora portuguesa, vestido preto, cabelos loiros e curtos, coloca no palco o seu sotaque “ora pois” e lê interpretando o poema “Pra Sempre”.
A platéia silencia-se, ao fundo quase se ouve o mar, Paraty se cala para ouvir ele: Drummond… a pele arrepia, o ar fica leve a respiração pesada, um quase choro se revela e ao final um “uau” geral, silencioso da plateia… aplausos… suspiros…lembranças…pensamentos…
A noite fica completa….”e de que era mesmo a mesa que viemos assisitir?”…não importa, me sinto plena, nem mesmo importa que tenha sido talvez a pior mesa da flip (Jonathan Franzen)…não importa….minha alma está alimentada….
Para Sempre
Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
– mistério profundo –
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.
Carlos Drummond de Andrade