para um líder pós-moderno, com jorge forbes (versão na íntegra)
“Tivemos uma eleição moderna em um ambiente pós-moderno”
Para o psicanalista Jorge Forbes, o debate político ainda está preso a uma estrutura baseada na matemática, no moralismo, na precaução, na hierarquia e nas certezas
O debate político durante a campanha presidencial de 2014 se pautou por dois monólogos. Candidatos e eleitores manifestaram suas certezas e convicções, mas nenhum dos lados estava disposto a ceder.“Tivemos uma eleição raivosa porque foi uma eleição moderna em um ambiente pós-moderno”, disse o psicanalista Jorge Forbes, introdutor dos conceitos e práticas de Jacques Lacan no Brasil, no Café Filosófico CPFL “Para um líder pós-moderno”, realizado na sexta-feira, 28/11, em Campinas (SP). O encontro fez parte do módulo “Novos tempos na política”, do qual Forbes foi o curador.
Em sua apresentação, o psicanalista elencou uma série de diferenças entre um líder moderno e um líder pós-moderno. Os primeiros, disse, operam em uma estrutura hierárquica e vertical e tentam provar a verdade baseada em números. “Ele acha que a matemática prova o que é certo e o que não é. É moralista e acredita que o cliente é rei, não cidadão. Ele é precavido e pouco inovador”, descreveu. Já o líder pós-moderno, prosseguiu, não atribui notas, mas responsabilidades. Por isso corre riscos. “O líder moderno é hierárquico; o pós-moderno compartilha. O líder pós-moderno privilegia as humanidades, em vez das ciências exatas. O líder moderno tem certeza. O pós-moderno convive com a dúvida e as ambiguidades.”
Essa mudança se dá ao longo do século XX, quando a evolução da ciência e da razão não impediu a eclosão de experiências traumáticas, como o Nazismo e as Grandes Guerras. Essas experiências levaram o sujeito a questionar a existência de “algo a mais no homem, como um elemento aglutinador, que não a razão”. “Nós amamos as pessoas apesar da razão, e não por alguma razão”, exemplificou. “Não há momento mais humano do que este século 21: as pessoas estão juntas porque querem, não por necessidade.”
Os protagonistas do debate político, no entanto, não pareciam atentos a essas transformações. Por isso a discussão girou em torno de um debate antiquado sobre “meu governo x seu governo”, “meu roubo x seu roubo”, “meu assessor x seu assessor”.
Esse deslocamento, afirmou, não desafia apenas o ambiente político. “As empresas modernas não sobreviverão”, disse. “Elas terão de refazer seus princípios. A maioria das pessoas que adere aos programas de demissão voluntária tem menos de 30 anos. As empresas terão de substituir a ideia de ‘treinamento’ para tarefas comuns pela ideia de absorver as diferenças.”
O psicanalista citou alguns dos “elementos reacionários” dessa transição, como as religiões e os livros de autoajuda. “Eles dizem o que se deve fazer.”