A ascensão do feminino
por Fernanda Bellei
Apesar de parecer que está avançando em uma velocidade meteórica, a conquista da liberdade feminina é resultado de passos gradativos. O psicanalista Tales Ab’Saber se utilizou de mitos e de marcos sociais para demonstrar esta silenciosa – e poderosa – evolução, que está processo de efervecência e ainda deixa muita gente – na maioria homens – sem entender ao certo a dimensão da mudança, o que pode gerar sentimentos como angústia e impotência.
Este “temor” que o homem tem do poder feminino, isto também não é resultado de uma imposição social ou está dentro da psique masculina? Isto é, o homem sempre foi cobrado a ter uma posição mais forte e dominadora…Talvez não seja isso que criou este medo ou a necessidade de ser o dominador é mesmo uma obsessão masculina?
Do ponto de vista de uma psicanálise estrita, as posições subjetivas importantes, significativas, sempre têm uma lógica interna, sempre têm uma lógica de fantasia, um processo de linguagem que tem uma certa autonomia. Mas esta pergunta é boa porque exatamente questiona o potencial social desta autonomia da fantasia. A ordem social não posiciona esta agressividade da masculina? Esta agressividade não é desejada para funcionar na vida de um certo modo? Eu acho que esta pergunta aponta para a possibilidade de que as alterações no interior desta estrutura subjetiva sejam causadas pelas alterações sociais significativas, quer dizer, mostra que há uma dialética, há uma correspondência.
Poderíamos entender então que esta ascensão social da mulher, que está deixando a condição essencialmente passiva para ser mais ativa, em todos os sentidos, também é fruto deste mesmo desejo social que antes desejava o homem como o dominador?
Eu acho que no fundo a gente está pensando em quais seriam as possibilidades melhores para produzir uma equação de Eros para uma civilização mais erótica, que também seria uma civilização mais livre e mais justa. E qual é o ponto para isso? Temos que ajustar o que está fora ou o que está dentro? Acho que tanto o que está fora quanto o que está dentro, senão não se chega a lugar nenhum.
A submissão feminina na vida social não está ligada a sua condição submissa na relação sexual, onde a mulher é sempre passiva?
Sim, esta é a questão da atividade e da passividade da pulsão e das posições hereditárias no próprio coração da relação. Mas a gente sabe que as relações sexual desenvolvidas suspendem esta ordem submissa, não é? A mulher se torna ativa e o homem se torna passivo, a gente sabe que no coração de uma relação sexual intensa e madura não se sabe bem quem é o homem e quem é a mulher. Há uma utopia aí, o amor é furtador de formas de superação de suas próprias contradições, mas será que a gente está à altura desta utopia? Estamos a altura de pensar esta diferenciação produtiva?
Em países nórdicos, as mulheres se portam na sociedade de uma maneira bem parecida com a do homem. O que proporciona isso? É um resultado de uma mudança, gerada por um desejo social, ou tem a ver com a tradição da sociedade?
Eu acho que esta é uma educação dialética. O eu e o outro se põem mutuamente, são posições relativas. O homem que posiciona a mulher em certo lugar, a posiciona para que ele esteja em outro lugar. O processo desencadeado por mulheres que discutem seus lugares e as equações que lhes foram impostas, ao fazerem isto, automaticamente elas estão exigindo que o homem se coloque em outro lugar, ele já não pode estar naquele lugar, e isto é muito exigente emocionalmente. Seria uma falta de sintonia na mudança? Existem mudanças catastróficas. Estruturas inteiras ruem e quando isso acontece há um momento de terror, pois ainda não tem nada no lugar, aí o amor é vital, pois as pessoas dependem dele para suportar tudo isso.