Poder e Luto originário | Frédéric Worms
Por Victor Costa
O filósofo Frédéric Worms deu continuidade ao ciclo de palestras internacionais da cpfl cultura. Ele apresentou, nesta última terça-feira, 8 de junho, a palestra “Poder, imanência e luto originário: o que o momento do vivente deve a Foucault, Deleuze e Derrida”. Worms, o mais conceituado pesquisador da Filosofia de Henri Bergson, é coordenador do Centre International d’Étude de la Philosophie Française Contemporaine e professor da École Normale Superieure, em Paris.
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No início de sua fala, Worms argumentou que o principal problema contemporâneo é o viver, a partir do qual a maioria das crises é subjacente. Mas e Foucault, Deleuze e Derrida? São justamente estes filósofos, segundo Worms, que nos permitem compreender que o problema do viver é urgente nos tempos atuais. O palestrante criou a hipótese que a questão do viver compõe o núcleo problemático das filosofias daqueles autores, que de certo modo antecederam o que viria a ser o grande problema contemporâneo.
Propôs, então, revisitar os pensamentos de Foucault, de Deleuze e de Derrida para verificar neles o modo pelo qual trataram a questão do viver. No pensamento de cada qual a questão da vida não é tomada diretamente como preocupação conceitual, mas é pensada através de outros elementos críticos. Em Foucault, pensada pelo viés do poder; em Deleuze, pelo da diferença; em Derrida, pelo da linguagem.
Em 1963, quando da publicação de “O Nascimento da Clínica”, a tese de Foucault foi que a medicina moderna em seu desenvolvimento passou a tratar a vida como objeto do saber, e do poder. Neste processo a vida passou a ser instrumentalizada. Em 1976, com “A História da Sexualidade” (A vontade de saber), Foucault retomou a mesma tese. Mas aí apresentou a noção geral do Biopoder. O poder moderno não apenas adota a vida como objeto entre outros sobre os quais incide, mas a tem como objeto principal. Para Worns, em Foucault “a vida não é apenas um objeto do poder, mas é o objeto do poder”.
Já em Deleuze, como se pode encontrar em “Diferença e repetição”, de 1968, a vida é produção de constantes diferenças que destroem a todo o momento as subjetividades. Explicou Worms que “todas as vidas são entendidas por ele como processos de demolição” de existências consolidadas. Em 1991, quando publica “O que é a Filosofia?”, com Félix Guatarri, Deleuze apresenta o ato criativo como postura de resistência à destruição. Os sujeitos resistem à vida ao criar conceitos nas Ciências, nas Artes e na Filosofia. É o viver o meio entre os pólos da criação e da destruição.
Derrida descreve em “A Escritura e a Diferença”, de 1979, a ideia que há um movimento que conduz a vida. Mas ele não tem um sentido direto, imediato. É em seu desenrolar que o movimento imputa seu próprio sentido. Como na linguagem, que busca sempre novos sentidos no seu próprio exercício. Worms expôs em detalhes como em sua última entrevista, publicada em 2004, com o título “Aprender finalmente a viver”, Derrida não mais aplicava a noção de luto à linguagem, mas à vida coletiva. Viver é sempre perder a existência do passado, do presente e do futuro: é movimento. Isto é a essência da linguagem, passa-se o mesmo com a vida. Enfatizou Worms: “é preciso insistir na vida, em seu movimento”.
O convidado encerrou a palestra ao fixar importantes contribuições dos pensamentos de Foucault, de Deleuze e de Derrida para a contemporaneidade são: a) a vida não é apenas um objeto, mas é uma construção; b) trata-se de atravessar a existência por força do ato criativo que permite o movimento de novas significações no curso mesmo da vida; c) a vida não é apenas um encontro, no final das contas, com a morte, mas é uma tensão entre perda e continuar a ser, é resistência a este movimento.
A palestra faz parte do módulo do Café Filosófico CPFL: “Anticlímax das sociedades contemporâneas – Foucault, Deleuze e Derrida frente à crise”, cuja curadoria é de Scarlett Marton, filósofa e professora da USP. Haverá mais três palestras, todas às terças-feiras, até o fim deste mês.