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feminismos, corpo e saúde: uma agenda no século 21, com simone diniz (versão completa)
“A menina foi estuprada e soube que as redes sociais estavam disseminando o que aconteceu com ela. As pessoas têm tanta certeza da impunidade que colocam na rede o que acontece”, disse a médica Simone Diniz, livre-docente da Faculdade de Saúde Pública da USP, no debate de abertura da série “O que querem as mulheres: poéticas e políticas feministas da atualidade” do Café Filosófico CPFL.
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“Ela não tinha denunciado até então. É um caso típico: está tão desorientada com o que aconteceu que as evidencias das provas ficam prejudicadas. Aí a imprensa diz: ‘era envolvida com trafico, tinha vida sexual’. Como se isso justificasse.”
No encontro sobre “Feminismos, corpo e saúde: uma agenda no século 21”, Diniz afirmou que o estupro coletivo ocorrido no Rio de Janeiro com uma jovem de 16 anos “fala muito da nossa cultura”. “Tentam desacreditar a moça e reafirmar a hierarquia de pessoas, de mulheres, principalmente. De um lado as ‘evas’, de outro as ‘marias’. O curioso é que essa questão é chamada de pauta de esquerda hoje em dia.”
O episódio levou a especialista a lembrar de outro caso, a do médico Roger Abdelmassih, acusado de estuprar suas pacientes.
“Tinha boletim de ocorrência de estupro desde quando ele fazia residência, e denúncias no CRM. Muita gente não denunciava porque era um homem muito importante. Não fossem as pacientes se organizarem, ele não teria sido preso, condenado”, lembrou.
“Até que ele conseguiu um habeas corpus e fugiu. Temos uma sequência de afirmações institucionais de impunidade. Que diz respeito à impunidade seletiva. A questão do aborto é típica. Mulheres de classe média têm acesso a clínicas seguras. E quem são as mulheres presas?”, questionou.
Para Simone Diniz, as conquistas dos feminismos em relação ao corpo têm sido ameaçadas atualmente por governos conservadores.
Embora veja a formação dos profissionais da área de saúde como um polo ainda muito conservador em questões relacionadas ao corpo da mulher, a palestrante disse estar otimista com os avanços que tem observado. “Tenho visto muita mudança institucional, mesmo no SUS – é pouco, mas já temos serviços de atendimento ao parto domiciliar, e no setor privado. A mudança é visível e irreversível.”
Ela citou uma série de iniciativas do Judiciário, com audiências públicas pelo Brasil inteiro, para denunciar casos de violência obstétrica. “O que está em debate é muito mais do que a técnica. São os valores: a integridade corporal, a respeito ao corpo do outro, as hierarquias sociais, a agressividade com relação aos genitais femininos.”