gravação | é preciso ser feliz – o sofrimento na nossa cultura do sucesso, com maria lívia moretto
a clínica psicanalítica é o reflexo – o espelho – da cultura, no sentido de que chegam ao psicanalistas as demandas relativas ao sofrimento que a eles lhe são endereçados, trazendo consigo o cerne das questões que envolvem não apenas o sujeito e o seu mundo, mas o sujeito no mundo. há uma relação intrínseca entre inconsciente, subjetividade e cultura, donde se parte do principio de que tanto a constituição subjetiva quanto as mudanças subjetivas se dão em um campo de alteridade, no laço social. para a psicanálise é fundamental o exame da relação que se estabelece entre as subjetividades e as mudanças da ordem social, econômica e politica de seu tempo. se freud era um crítico da cultura, as perguntas que aqui se colocam são: qual crítica fazemos da cultura que testemunhamos? o que acontece hoje – contemporaneidade – que não acontecia antes, influindo de modo decisivo na construção das subjetividades que se apresentam aos psicanalistas?
se é válido perguntarmos sobre a validade de um sofrimento tipicamente contemporâneo no brasil, comecemos por aí: como os sujeitos que buscam uma análise apresentam o seu sofrimento hoje? o argumento que orienta a discussão que se segue é que toda expressão de sofrimento traz em si uma demanda de reconhecimento, mas entre o desejo de reconhecimento e o reconhecimento do desejo, é preciso que examinemos de modo crítico a relação do sujeito com os ideias de sucesso, beleza, autonomia e autenticidade.